O velho Twitter não existe em lugar algum
Nem no Bluesky, nem no Mastodon e com certeza não no Threads
Levanta com o celular na mão e saia correndo, porque lá vem a história.
Antes do Twitter
Em 2006, descobri no Orkut que era possível fazer uma página virtual própria gratuitamente. Criei, então, o blog “Negão Internauta”. Como vários da época, a ideia era apenas ter um lugar para publicar ideias, pensamentos. A coisa evoluiu rápido e passei a criei perfis em sites que possibilitavam a divulgação da página.
Foi numa dessas que criei um perfil num novo site, que se dizia uma “rede de microblogs”, chamado Twitter.
O começo e a “Era de Ouro do Twitter”
O limite de 140 caracteres por publicação, pergunta da página inicial (“O que está acontecendo?”) e a atualização instantânea fizeram com que os primeiros tweets fossem a resposta mais franca possível. “Assistindo TV”, “lavando a louça”, “penteando o cabelo”. Era como a criação do mundo, primeiro veio o verbo.
Como quem escrevia também lia e respondia, aos poucos foi se moldando o que seria o twitter por muito tempo: uma rede para se falar o que vinha na cabeça. Por vezes era sobre um acontecimento que todos acompanhavam ao vivo, mas por vezes era apenas algo intrusivo, socialmente incorreto demais para se despejar na vida offline.
E foi basicamente isso que tornou o Twitter um site único, uma enorme praça pública virtual, onde ia-se para comentar o assunto do momento ou simplesmente para desabafar.
Aliados a isso, algumas características reforçavam esse comportamento. Os aplicativos de terceiros, o selo de verificação de perfil (o “selo azul” ou “verificado”), a republicação (Retweet, que foi invenção dos usuários e incorporado à plataforma).
O fim do Twitter como conhecíamos
Muito antes do bilionário sul-africano ter a infeliz ideia de comprar o Twitter, o site já insistia em tomar decisões erradas constantemente. Cortou acesso de todos os aplicativos de terceiros, sem ter substitutos à altura, deixou o selo de verificação se tornar símbolo de status para então passar a distribuí-lo sem um critério claro e o pior, passou a priorizar a distribuição de conteúdo por algoritmos.
Essa última foi definitiva para o fim da Era de Ouro do Twitter. Agora a questão não era o que estava acontecendo no momento, mas quais são os assuntos que vão manter os usuários engajados por mais tempo dentro do aplicativo.
Depois disso, os usuários, principalmente os novos, se acostumaram a entrar no twitter não para ler os perfis, mas para ver o assunto. Não importava mais quem estava falando, mas o que era falado.
Em uma rede voltada para o algoritmo, como são Twitter, Youtube, TikTok, Instagram, etc… o usuário já se acostumou a interagir apenas para treinar o site para entregá-lo aquilo que ele quer ver. Mas isso vale para os dois lados, então quem quer ser lido também aprende a entregar o que o algoritmo quer.
E assim, chegamos a fase decadente do Twitter, onde os humanos robóticos já tomavam conta, sem saber que logo seriam substituídos por robôs, mais baratos e eficientes.
Pós-Twitter
O Twitter já não existe, metaforicamente e literalmente. No Brasil, nem o site que ainda usa sua base de dados é acessível no momento. E no vácuo que ele deixou, as principais opções são Bluesky, Mastodon e Threads.
Esse último não é um substituto nem do velho, nem do novo Twitter. Trata-se de mais uma rede do Meta, ou seja, é uma mistura de Instagram e Facebook, tanto na distribuição de conteúdo fortemente pesada no algoritmo, quanto nos usuários, que sempre parecem não entender direito como funciona a internet ou o que está acontecendo no mundo.
O Mastodon parece ser um manifesto, como todo projeto de código aberto de larga escala, mas por enquanto ainda possui mais barreiras do que atrativos para o usuário comum.
O Bluesky tem tudo para ocupar esse espaço. Já tem uma boa base de usuários, a experiência é personalizável sem ser extremamente automatizada, a moderação de conteúdo é focada no que importa. O grande problema para eles vai ser manter essas boas ideias enquanto resiste a duas tentações: a de se vender e a de tentar agradar o usuário viciado no algoritmo do Twitter (X).

Aquele velho Twitter não tem mais espaço. Ele só era possível porque não havia nada como ele e não houve nada antes dele. Agora, nessa disputa por espaço e atenção, fica a dúvida se sequer há público para comentar sobre o que está acontecendo ou se as pessoas querem apenas consumir assuntos servidos numa bandeja por um garçom sem rosto.